sábado, 13 de fevereiro de 2010

POLÍTICOS E JORNALISTAS

Pouco mais de cinco anos volvidos sobre a demissão do governo então liderado por Pedro Santana Lopes, eis-nos mergulhados em novo episódio rocambolesco que poderá muito bem conduzir a idêntica conclusão.

O avolumar das dúvidas sobre a integridade de carácter do actual primeiro-ministro pode estar a atingir um ponto de insustentabilidade. Já não são apenas questões como a da licenciatura relâmpago ou um possível (mas dificilmente provado) envolvimento num caso de corrupção (o caso Freeport); agora é trazido a lume um muito provável conluio para a manipulação de um ou vários órgãos de comunicação social, descoberto durante um processo de investigação policial a um outro caso de corrupção económica, o caso Face Oculta, envolvendo personalidades do PS.

Por muito que se procure defender o princípio jurídico da presunção da inocência e do círculo próximo de José Sócrates continuar a tentar veicular a ideia de que tudo não passará de um amontoado de coincidências, o facto é que estas começam a ser em número demasiado e talvez seja chegada a altura do PS deixar de enterrar a cabeça na areia e admitir que o problema existe e tem um nome: José Sócrates e amigos.

Porém, o problema não é recente e nem sequer é específico do partido no poder. Casos como os que a comunicação social tem divulgado têm sido recorrentes nas últimas décadas em Portugal
[1] e a razão da sua ocorrência tem que ser procurada muito além da existência de censura em Portugal, como Manuela Moura Guedes reclamou perante as câmaras da SIC[2].

Que tudo indica que José Sócrates e o seu círculo mais próximo estará envolvido numa tentativa para controlar alguns dos meios de informação nacional, parece uma realidade cada vez mais difícil de negar, agora que tal tipo de comportamento redunde na existência de censura só parece possível na cabeça de “fazedores de notícias” como Manuela Moura Guedes. Como muito a propósito escreveu Batista-Bastos, esta semana no
DN[3], a dúvida sobre a existência, ou não, de censura só pode ser levantada por quem não «…vem do tempo em que se escrevia baixinho, tão baixinho que perdêramos muitas das palavras, por mudez e falta de uso», ou, acrescento eu, quem por manifesta má fé ou absoluta ausência de valores acha que tudo vale para atingir o objectivo de substituir José Sócrates.

Na prática, o que tenho lido e ouvido nos últimos dias leva-me a colocar no mesmo prato da balança o inaceitável José Sócrates e os imprestáveis que mais não querem que atingir a sua posição. Entre os que afanosamente defendem um primeiro-ministro desprovido de ética e de valores, como os da liberdade e os do direito à opinião, e os que se afadigam e desdobram hoje em críticas mas que quando ocuparam os corredores do poder agiram de forma praticamente igual
[4], não consigo estabelecer qualquer diferença.

Refutando liminarmente a ideia da existência de censura, não posso deixar de criticar os políticos (da esfera do governo ou da oposição) que não enjeitam a primeira oportunidade para manobrar e manipular a imprensa e os jornalistas que temos e que mais do que informar procuram apenas a “caixa” bombástica que assegure uma boa manchete, uma maior tiragem e quiçá uma promoção mais rápida.

É que se a algum político terá passado pela cabeça a ideia de poder “manobrar” publicações, não será também porque a maioria dos “jornalistas” peca pelas reduzidas qualidades profissionais que tão espalhafatosamente exibe?
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[1] A prová-lo esteve o I que no Verão passado publicou um conjunto de artigos (cerca de duas dúzias) sobre os “casos” mais polémicos registados após o 25 de Abril de 1974, que podem ser lidos aqui.
[2] A declaração pode ser lida aqui.
[3] A crónica intitulada «Liberdade, eis a questão», pode ser lida aqui.
[4] Ainda que julgue desnecessário, sempre recordo o muito pouco digno episódio que em 2004 rodeou a suspensão da participação de Marcelo Rebelo de Sousa no Jornal Nacional da TVI, envolvendo o presidente daquela estação de televisão (que, segundo esta notícia do PUBLICO, o visado denunciou à Alta Autoridade para a Comunicação Social) durante o governo de Santana Lopes, ou a verdadeira guerra que na década de 80 então rodeou a imprensa escrita nacional, traduzida como refere Batista-Bastos na crónica que já anteriormente citei «…extinção de títulos, a substituição de direcções de jornais e a remoção de jornalistas incómodos por comissários flutuantes...». A propósito da actual polémica sobre a censura que pesará sobre os jornalistas, recomendo a leitura de outra crónica de Batista-Bastos (escritor e jornalista que verdadeiro repositório ainda vivo de outros tempos, muito poderá ensinar aos mais novos sobre o assunto), a que ontem publicou no JORNAL DE NEGÓCIOS, sob o título «Sobre a liberdade de imprensa e algumas coisa mais»

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