terça-feira, 26 de maio de 2009

DISPONHAM, MEUS SENHORES

Depois de nas últimas semanas terem voltado a ser notícia os problemas (e as soluções) para o BPP, eis que ontem a TSF informava que os «Clientes do BPP vão permanecer no banco até terem garantias do pagamento dos depósitos», naquilo que se pode definir num óbvio mecanismo de pressão e de intimidação, que parece estar a produzir frutos, pois segundo informou pouco depois, o JORNAL DE NOTÍCIAS, os ocupantes abandonaram as instalações depois de receberem um documento da administração do BPP que reconhecerá «…que os detentores dos Retorno Absoluto são pequenos aforradores e não investidores…».

Estes são apenas mais alguns exemplos das muitas notícias que sobre o assunto têm sido difundidas. Desde a que garantia que o «Governo ultima solução para o Banco Privado Português» ou a que dizia que «Teixeira dos Santos assegura solução rápida para os clientes do BPP», para não falar nas que retratam outras realidades[1], até uma mais antiga que assegurava que «Há mecanismo na lei para proteger clientes do BPP», todas abordam o problema sem nunca esclarecerem aquela que me parece continuar a ser a questão de fundo: o BPP aceitava depósitos dos clientes, há semelhança do que acontece com os bancos comerciais, ou, tratando-se de um banco de investimento procedia à aplicação das disponibilidades dos clientes com vista à maximização dos seus rendimentos?

É que a diferença além de enorme – os primeiros actuam, ou devem actuar, na qualidade de fiéis depositários dos valores colocados à sua guarda, enquanto os segundos realizam uma mera operação de intermediação e aconselhamento junto dos clientes – constitui o essencial da grande polémica e poderá representar a canalização de 1,27 mil milhões de euros[2] do orçamento do Estado para as contas dos clientes do BPP.

No sentido de me informar e de procurar resolver de forma definitiva esta questão, procurei na página do Banco de Portugal na Internet esclarecer, sem sucesso, a qualidade em que aquele banco central e entidade reguladora do mercado financeiro nacional licenciou o Banco Privado Português. É que se o fez enquanto banco de investimento e tudo indica que assim tenha sido a avaliar pelo conteúdo da própria página na Internet do BPP que afirma ser «um Banco de Investimento que promove a gestão patrimonial como um todo, através do conceito de Global Wealth Management (activos financeiros, imobiliário, aconselhamento fiscal, arte) não esquecendo áreas tão importantes e decisivas como o Corporate Advisory e o Private Equity», não me parece restar qualquer dúvida que os créditos reclamados pelos seus clientes não possam ser comparáveis aos depósitos bancários que são realizados nos bancos comerciais.

As próprias autoridades (Governo e Banco de Portugal) acabam por confirmar indirectamente esta minha interpretação quando vêm agora assegurar que a «Legislação será alterada para que clientes do BPP recebam os seus depósitos» o que seria de todo em todo desnecessário caso o banco tivesse recebido depósitos, pois existe para o conjunto do sistema bancário o chamado fundo de garantia dos depósitos que actualmente assegura «…o reembolso do valor global dos saldos em dinheiro de cada depositante, de acordo com determinadas condições, nomeadamente quando aquele valor não ultrapasse 100.000 euros...»[3].

A própria notícia do PUBLICO (que referi no parágrafo anterior) confirma que aquela decisão de alteração da legislação resulta do facto dos clientes do BPP estarem em vias de ver satisfeita não só a reivindicação de que as suas contas sejam equiparadas a depósitos a prazo – situação em que ao abrigo do Fundo de Garantia dos Depósitos (do qual o BPP é membro) os clientes teriam o direito ao ressarcimento até ao limite de 100.000 euros por conta –, mas também a de se verem reembolsados na íntegra pelos valores entregues (consciente ou inconscientemente) ao BPP.

Enquanto continua por esclarecer as responsabilidades dos anteriores gestores daquele, a ponto de o ECONÓMICO ter referido a existência de «Suspeita de contas fictícias no BPP», parece que a situação dos “pobres” depositantes[4] já estará garantida e que há semelhança de outras será custeada pelo conjunto dos contribuintes nacionais; resta-me a esperança de que ao menos os 3 mil felizes clientes não constem nas listagens da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos na qualidade de devedores ou até de tristes remunerados com o Salário Mínimo Nacional.
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[1] Entre estas destaquem-se as que asseguravam que «Presidente do BANIF defende solução rápida» ou que «Sindicato faz apelo para Estado não deixar falir BPP»
[2] A revista VISÃO do passado dia 14 de Maio referia o valor de 1.270 milhões de euros como sendo o valor total das aplicações em produtos de retorno absoluto, enquanto esta notícia do PUBLICO, de dia 19, referia apenas 1,2 mil milhões de euros.
[3] A citação foi retirada da página na Internet do Fundo de Garantia dos Depósitos.
[4] Utilizo esta expressão na medida em que os números divulgados pela imprensa (3 mil contas de retorno garantido e 1,27 mil milhões de euros) revelam que cada cliente terá “depositado” em média mais de 420 mil euros, valor que é seguramente muito superior ao saldo médio da esmagadora maioria dos portugueses.

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