quarta-feira, 28 de agosto de 2019

GRUNHOLÂNDIA


Quando vi, há dias, as imagens de uma peça televisiva onde aparecia um Donald Trump visivelmente incapaz de esconder a irritação e a frustração perante a evidência do convite formal do G7 para uma reunião com o ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, voltou-me à memória o sucedido em meados deste mês quando surgiram as primeiras notícias de que «Trump manifesta interesse em comprar a Gronelândia», a que se sucederam várias reacções, havendo até quem tenha preferido salientar a irónica reacção dinamarquesa, que vendo bem até nem parece exagerada.

Claro que há antecedentes históricos da compra de territórios (os mesmos EUA compraram, no início do século XIX, a Louisiana aos franceses, em meados desse século compraram o Alasca aos russos e algumas dezenas de milhares de quilómetros quadrados aos vizinhos mexicanos, para no final desse século comprarem as Ilhas Filipinas aos espanhóis e em 1917 compraram à Dinamarca o que hoje é conhecido como as Ilhas Virgens Americanas) mas ao que parece não há registo histórico de algum dirigente o ter anunciado da forma que Trump agora o fez.


É que não há palavras para descrever a afirmação do imperador do Twitter de que quer comprar a Gronelândia para projecto imobiliário, quando são amplamente conhecidas as potenciais riquezas minerais dum território que o aquecimento global – que Trump continua a negar – está em vias tornar economicamente acessíveis, uma afirmação daquele jaez é, no mínimo, insultuosa para inteligência dos habitantes da região e do resto do planeta.

A reafirmação, uns dias depois de que «Trump confirma interesse em comprar a Gronelândia» e a reacção traduzida em adiar visita à Dinamarca após ver recusada a compra da Gronelândia, apenas revela um comportamento de quem ainda não aprendeu a ser contrariado e tem até o despautério de ainda endereçar a responsabilidade aos dinamarqueses quando justificou o cancelamento com a jactante afirmação: "Não se fala assim com os EUA".

E não é apenas a atitude de Trump que deve merecer crítica e repúdio, pois este episódio é apenas mais uma confirmação da grande impreparação da equipa que integra a actual administração norte-americana (que o deixa proferir este e outro tipo de alarvidades), de pouco ou nada servindo as tentativas de branqueamento ou apaziguamento do tipo: «Trump e a compra da Gronelândia. Uma loucura ou um contributo para a paz mundial?»

Trump gere os assuntos públicos norte-americanos com a mesma boçalidade que gerirá as suas empresas, esquecendo que as relações entre Estados diferem (e muito) do modelo relacional dependente patrão-empregado.

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