terça-feira, 23 de maio de 2017

O ESTADO ISLÂMICO SEMPRE EXISTIU, É A ARÁBIA SAUDITA

No momento em que escrevo ainda se ignora como irá terminar o périplo entre o Médio Oriente e a Europa que Donald Trump está a realizar, mas a julgar pela imprensa nacional a sua breve passagem pela Arábia Saudita ficará assinalada pelo feito inédito onde «Trump faz as pazes com o islão e apela à luta contra a radicalização»; claro que também mereceu destaque a celebração dum acordo onde os «EUA vendem armas de 110 mil milhões de dólares à Arábia Saudita», mas isso não revestiu qualquer novidade nem a conhecida hipótese desse armamento acabar nas mão dos grupos jihadistas parece ter indignado ninguém.


Já o aparente retorno a uma sintonia de posições entre Washington e Riad, depois do muito propalado distanciamento praticado pela administração Obama, pode não passar disso mesmo, na linha aliás duma antevisão da deslocação a Tel-Aviv onde se anuncia que «Depois de visitar a Arábia Saudita, Trump chega a Israel com plano indefinido».

Como é sabido há décadas (cinco para ser mais preciso) o grande tema no Médio Oriente continua a ser a questão palestiniana, ou melhor a implantação de um estado judaico que recusa a existência palestiniana, e a histórica divisão dos estados árabes. Por isso mesmo e pelo histórico confronto com os persas, a monarquia saudita não hesitou na acusação de que o Irão é "ponta de lança do terrorismo mundial».

Mais estranho é ler esta e outras afirmações, como aquela onde «Trump acusa Irão de desestabilizar a região e apoiar os crimes de Assad», sem significativa referência à reconhecida interdependência entre a oligarquia saudita e o movimento wahhabita (movimento ultraconservador geralmente apontado como a “religião oficial saudita” e que a par do salafismo está na origem de organizações radicias como a Al-Qaeda e o Daesh), nem o facto de há décadas o reino saudita estar a financiar a maioria das mesquitas e madrassas (centros de difusão e divulgação corâmicos) que pelo mundo fora são associadas ao extremismo islâmico e ao recrutamento de jihadistas.

Claro que é fácil entender as motivações da administração Trump na crítica ao Irão (porque ainda não ultrapassou o fracasso que constitui o derrube do regime do Xá Reza Pahlevi ou que mais não seja para se mostrar diferente de Obama), na defesa intransigente do Estado de Israel ou até num possível apoio às pretensões hegemónicas dos sauditas no conflito latente que os opõe aos iranianos; o que não devemos é silenciar as verdadeiras razões que estarão por detrás de tudo isso, quando até bastaria ter recordado uma entrevista de Ziauddin Sardar, quando durante uma sua passagem por Lisboa deixou bem claro que «“O Estado Islâmico sempre existiu, é a Arábia Saudita”» e que sem um efectivo combate aos extremismos wahhabita e salafista não se erradicará o terrorismo islâmico.

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