No momento em
que escrevo ainda se ignora como irá terminar o périplo entre o Médio Oriente e
a Europa que Donald Trump está a realizar, mas a julgar pela imprensa nacional
a sua breve passagem pela Arábia Saudita ficará assinalada pelo feito inédito
onde «Trump
faz as pazes com o islão e apela à luta contra a radicalização»; claro que
também mereceu destaque a celebração dum acordo onde os «EUA
vendem armas de 110 mil milhões de dólares à Arábia Saudita», mas isso não revestiu
qualquer novidade nem a conhecida hipótese desse armamento acabar nas mão dos
grupos jihadistas parece ter
indignado ninguém.
Já o aparente
retorno a uma sintonia de posições entre Washington e Riad, depois do muito
propalado distanciamento praticado pela administração Obama, pode não passar
disso mesmo, na linha aliás duma antevisão da deslocação a Tel-Aviv onde se
anuncia que «Depois
de visitar a Arábia Saudita, Trump chega a Israel com plano indefinido».
Como é sabido
há décadas (cinco para ser mais preciso) o grande tema no Médio Oriente
continua a ser a questão palestiniana, ou melhor a implantação de um estado judaico
que recusa a existência palestiniana, e a histórica divisão dos estados árabes.
Por isso mesmo e pelo histórico confronto com os persas, a monarquia saudita
não hesitou na acusação de que o Irão
é "ponta de lança do terrorismo mundial».
Mais estranho
é ler esta e outras afirmações, como aquela onde «Trump
acusa Irão de desestabilizar a região e apoiar os crimes de Assad», sem
significativa referência à reconhecida interdependência entre a oligarquia
saudita e o movimento wahhabita (movimento ultraconservador geralmente apontado
como a “religião oficial saudita” e que a par do salafismo está na origem de
organizações radicias como a Al-Qaeda e o Daesh), nem o facto de há décadas o
reino saudita estar a financiar a maioria das mesquitas e madrassas (centros de
difusão e divulgação corâmicos) que pelo mundo fora são associadas ao
extremismo islâmico e ao recrutamento de jihadistas.
Claro que é
fácil entender as motivações da administração Trump na crítica ao Irão (porque
ainda não ultrapassou o fracasso que constitui o derrube do regime do Xá Reza
Pahlevi ou que mais não seja para se mostrar diferente de Obama), na defesa
intransigente do Estado de Israel ou até num possível apoio às pretensões
hegemónicas dos sauditas no conflito latente que os opõe aos iranianos; o que
não devemos é silenciar as verdadeiras razões que estarão por detrás de tudo
isso, quando até bastaria ter recordado uma entrevista de Ziauddin Sardar,
quando durante uma sua passagem por Lisboa deixou bem claro que «“O
Estado Islâmico sempre existiu, é a Arábia Saudita”» e que sem um efectivo
combate aos extremismos wahhabita e salafista não se erradicará o terrorismo
islâmico.
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