terça-feira, 15 de setembro de 2009

DE DERROCADA EM DERROCADA

O dia 15 de Setembro de 2008 – data da falência do Lehman Brothers – além de ter assistido ao que para muitos era impensável e de isso quase ter acarretado a completa derrocada de Wall Street, ficou também marcado como a data a partir da qual não se pode mais esconder a existência de um crise de grandes proporções.

Assinalando a data, escreveu ontem o PUBLICO que a «Crise financeira custou 6900 euros a cada cidadão», fazendo-se eco de um trabalho que a BBC NEWS publicara uns dias antes[1] e que estimava o custo das políticas de intervenção dos governos dos países mais desenvolvidos em 11 biliões de dólares (o equivalente a cerca de 7,5 biliões de euros), enquanto hoje nos mimoseou com uma peça sobre «O que mudou depois de Setembro de 2008», que apesar de importante como sistematização de ideias e de acontecimentos e de assinalar que o início da crise é anterior à falência do Lehman Brothers, centra a observação demasiadamente na vertente financeira da crise (de inegável importância), mas quase esquece o papel desse sector na hora de formular alternativas para o futuro.

De uma forma geral, quer a nível interno quer internacional, rara é a publicação que vai além de formular piedosas intenções de reformulação dos sistemas de controlo bancário (em perfeita sintonia com as anunciadas intenções de Sarkozy, Merkel e Obama) mas de reconhecida insuficiência prática.

Poucos abordam os problemas das economias debilitadas pela recessão económica sem trazer à primeira linha de argumentação as dificuldades de liquidez originadas pela retracção no crédito bancário, como se fosse lógico e natural que empresas e famílias vivam fortemente dependentes do crédito e não dos ganhos (lucros e salários) das respectivas actividades.

Nas vésperas de mais uma cimeira dos países mais ricos continua a insistir-se no absurdo princípio da superioridade de um modelo económico que, impondo um sistema de globalização dos mercados, conduziu a um enriquecimento desmedido dos capitais transnacionais enquanto condenou o trabalho e os capitais locais ao empobrecimento absoluto e direccionou o Mundo para uma situação de quase apocalipse.

É evidente que um debate sobre o futuro modelo de regulação financeira é importante, mas a este já deveria ter-se sobreposto um outro muito mais importante: a definição de um novo papel para o sistema financeiro, forçando a separação entre as actividades bancárias clássicas (recolha de fundos e respectiva aplicação na actividade creditícia) e as novas vertentes puramente especulativas.

Por último, como principal garantia para que a futura actividade financeira se resuma ao financiamento da economia e para que a compulsão para a tomada de riscos seja minimizada, é indispensável fazer regressar à esfera pública a capacidade de criação de moeda, limitando essa capacidade do sector financeiro ao mínimo indispensável aos níveis de liquidez saudável e nunca aos níveis de alavancagem actual.

A hesitações e tergiversações dos principais líderes mundiais não auguram para breve qualquer alteração radical no modelo de organização e funcionamento do sector financeiro, pelo que notícias como a divulgada há dias pelo PUBLICO, dizendo que «Greenspan prevê que a “natureza humana” gerará novas crises» são mais que seguras e proféticas; são uma segura garantia de um dos principais obreiros do mais iníquo dos sistemas de concentração da riqueza geral nas mãos de um reduzido grupo de grandes financeiros.
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[1] O texto integral pode ser lido na peça «Follow the money», sendo que o seu principal interesse reside sobretudo na revelação do peso das ajudas públicas no PIB de países como os EUA e o Reino Unido.

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