Talvez seja oportuno, num momento em que a convulsão social no mundo árabe parece uma evidência e quando a propósito duma alegada (porque ainda não provada) tentativa de agressão sexual atribuída a uma alta figura mundial (na ocorrência, Dominique Strauss-Khan, o director-geral do todo-poderoso FMI) se relembra o famoso efeito do bater de asas duma borboleta[1], estender este aforismo à situação que se vive no Médio Oriente e Norte de África, ou seja, numa parte próxima e muito significativa do mundo islâmico.
Neste caso (e a crer na generalidade da imprensa ocidental) o bater de asas da borboleta será bem menos perturbador e objecto até duma clara distinção entre situações que poderão afinal ser bem mais semelhantes do que agora aparentam.
Se nos casos da Tunísia. Egipto e Líbia a posição ocidental (com os EUA à cabeça) foi consensual no apoio aos contestatários ao “status quo”, incluindo no extremo – o caso líbio – a aprovação na ONU duma intervenção militar, já no caso sírio as posições ocidentais balizam-se entre um discreto apoio diplomático e uma clara campanha informativa contra o regime de Bashar Al-Assad.
A avaliar pelas notícias que vão chegando parece existir uma clara distinção entre os movimentos de rejeição líbio e sírio, pese embora o número crescente de vítimas que este tem vindo a registar, facto tanto mais estranho quanto no primeiro o regime do coronel Kadhafi insiste na infiltração de movimentos próximos da Al-Qaeda e no caso do segundo continuam por explicar o número de polícias mortos às mãos de civis teoricamente desarmados.
Enquanto persistem estas dúvidas e se assiste a pontuais recrudescimentos de violência na Tunísia e no Egipto (com especial relevo para os confrontos religiosos entre muçulmanos e cristãos coptas), continua por enfrentar a situação israelo-palestiniana que no passado fim-de-semana voltou a provocar mais baixas fatais[2], quando, assinalando a passagem de mais um aniversário da Al-Nakba[3], se verificaram confrontos entre manifestantes palestinianos e o exército e a polícia judaica em vários pontos dos territórios ocupados e nas zonas fronteiriças.
Os incidentes ocorridos nos Montes Golan (território que faz fronteira com a Síria e cuja ocupação por Israel não é reconhecida pela ONU) poderão ser, como já apontados por alguma imprensa, uma estratégia de Bashar Al-Assad junto dos poderes ocidentais (americanos e judeus) para justificar a sua manutenção no poder enquanto garante de alguma estabilidade na região, mas são um inegável indicador da incapacidade da comunidade internacional na resolução dum conflito que se arrasta desde os anos 30 do século passado e um claro sinal de que uma pequena variação nas condições em determinado ponto de um sistema dinâmico pode ter consequências de proporções inimagináveis (o tal bater de asas da borboleta) apenas adquirirá tais proporções quando isso interesse aos poderosos.
[1] Ver a propósito o artigo que Leonídio Paulo Ferreira assinou no DN
[2] De acordo com esta notícia do EURONEWS, o número será da ordem da dezena de palestinianos mortos.
[3] Expressão árabe que significa “a Catástrofe” e que desde a Guerra Israelo-Árabe de 1948 assinala a independência do Estado de Israel e o êxodo de cerca de um milhão de judeus para os países vizinhos. Este processo de expulsão colectiva deu origem à ainda hoje corrente classificação de “ausente presente” que é atribuída aos palestinianos que vivem em Israel mais viram as suas propriedades anexadas e a sua cidadania questionada.
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