quarta-feira, 28 de novembro de 2007

PUTIN FOREVER

Enquanto se aproxima a data das eleições legislativas na Rússia tem-se assistido a um crescendo da limitação das actividades dos oposicionistas a Vladimir Putin. que parece já se ter decidido a ser o próximo primeiro-ministro depois de abandonar a presidência.

Particularmente mediática, pelo menos entre a imprensa ocidental, foi a detenção no último fim-de-semana do mais conhecido líder da oposição, o ex-campeão mundial de xadrez Gary Kasparov, a par com outras figuras da oposição.

Mais popular na Rússia pela sua actividade enquanto jogador de xadrez que pela sua actividade política, Kasparov é apontado como possível candidato presidencial da coligação «A OUTRA RÚSSIA» que junta a sua Frente Civil Unida ao Partido Nacional Bolchevique, de Eduard Limonov, e ao Partido Republicano da Rússia, de Vladimir Ryzhkov, o que o poderá ter colocado na primeira linha dos opositores a Putin.

Num país onde o leque de forças políticas se tem revelado particularmente fluído e do qual a informação que nos chega é invariavelmente enviesada pelo ponto de vista dos partidários de Putin ou pelos seus críticos (as vozes independentes são praticamente inexistentes) e a situação interna é algo quase tão difuso como o foi ao tempo da União Soviética, torna-se particularmente difícil avaliar a correcta dimensão da informação que nos vai chegando.

Certo, para já, é que a par com o favoritismo do Partido Rússia Unida, onde pontifica a figura de Putin, os EUA e a UE já manifestaram as suas dúvidas quanto ao modo como se prepara o acto eleitoral do próximo fim-de-semana e a presença da equipa de observadores da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa) parece comprometida, com responsáveis da organização e do governo russo a trocarem acusações mútuas e Putin a vir a público declarar que o que o ocidente pretende é minar a legitimidade do acto eleitoral.

Este tipo de situação, ao invés de servir os opositores de Putin poderá constituir um ponto de partida muito favorável ao actual presidente russo, tanto mais que em matéria de legitimidade eleitoral o ocidente não pode pretender-se o papel de exemplo impoluto. Veja-se os EUA – o autoproclamado bastião da democracia e da liberdade – que tem revelado enormes fragilidades democráticas, ou já foi esquecida a forma como ocorreu em 2000 a eleição de George W Bush[1] para o seu primeiro mandato? E que dizer do acordo que se diz existir entre os partidos nacionais do PS e do PSD para rever a lei eleitoral autárquica?[2] Como classificar a persistente recusa na aceitação dos votos brancos como votos validamente expressos?

Seguramente que os países ocidentais prestariam melhor serviço aos partidários russos de um sistema mais aberto, caso investissem mais na criação de modelos idóneos e de dignidade no interior dos seus próprios sistemas eleitorais e se essa mesma experiência fosse depois utilizada no sentido de melhorar aqueles sistemas, abdicando de uma estratégia de confrontação (ainda que meramente retórica) em benefício de uma prática pelo exemplo. Mas isso, todos nós sabemos que é bem mais difícil...
____________
[1] Na corrida entre o democrata Al Gore e republicano George W Bush, em face de uma sucessão de procedimentos legais interpostos pelas duas candidaturas e um interminável processo de contagem de votos no estado da Florida (onde por acaso, ou talvez não, o governador era irmão deste último) o Tribunal Supremo decidiu nomear o candidato republicano independentemente do resultado da contagem dos votos.
[2] Ver, por exemplo esta notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS.

Sem comentários: