quarta-feira, 20 de junho de 2007

UMA SURPRESA, MUITAS DÚVIDAS

Numa época de grandes transformações em que as notícias (e as novidades) se sucedem a um ritmo alucinante parece que nada já nos poderá espantar, porém, de quando em vez algo vai surgindo para contrariar esta ideia.

Não tanto pelo conteúdo, mas principalmente pelo título (as manchetes anda continuam a ser importantes no dia a dia) esta notícia do PUBLICO merece que lhe dediquemos alguma atenção:
TRABALHADORES PORTUGUESES VÃO TER OS AUMENTOS REAIS MAIS BAIXOS DA OCDE ATÉ 2008

A contínua erosão do poder de compra das classes trabalhadores em Portugal é algo que poderá espantar os analistas da OCDE (o que duvido); a divulgação da novidade poderá suscitar críticas dos “analistas” nacionais tradicionalmente próximos dos partidos governamentais (“noblesse oblige” e de quando em vez é preciso sair em defesa dos “chefes”), poderá até aumentar o tom e o número dos que ao longo de anos têm vindo a dizer o mesmo (sem nenhuma espécie de sucesso), mas não constitui qualquer novidade para os que sentem esse efeito no bolso.

Mas o mais espantoso da notícia não é a revelação de uma evidência, negada por muitos, mas o teor das explicações que a própria OCDE avança.

Quem iria esperar de um organismo com a reputação, a seriedade e um historial de total subordinação aos interesses económicos dominantes, uma explicação que aponta para a responsabilização da globalização – em particular para o fenómeno da deslocalização das unidades industriais – e para a inoperância dos governos dos seus países membros (por acaso os mais industrializados do planeta)?

Tranquilizem-se os mais impetuosos! A OCDE não afirma que a responsabilidade da situação é do modelo de desenvolvimento, nem do desajustamento das teses liberais.

A verdadeira explicação para esta quase apostasia reside no facto daquele organismo recear que a “corda esteja a esticar demais” e que num futuro próximo os responsáveis políticos pelo actual estado das coisas possam vir a sofrer consequências.

No documento "Employment Outlook 2007", ontem divulgado pela OCDE, questões como o efeito da globalização e do aumento das importações sobre o número de empregos e sobre os salários, apesar de afloradas, ficaram por responder.

Convenientemente, os autores do estudo, ficaram-se pelo enunciado de algumas evidências (tão evidentes que só não as vê quem não quer ver) como a de que o aumento das desigualdades sociais terá resultado, principalmente, da adopção de tecnologias de ponta geradoras de uma procura crescente de trabalhadores qualificados em detrimento dos restantes e de um maior investimento das empresas em tecnologias de capital intensivo. Sobre o devastador efeito resultante da generalização de um sistema de desenvolvimento económico exclusivamente baseado nos ganhos de capital, nem uma palavra.

De forma explícita ou disfarçada, a generalidade dos analistas (pelo menos os que maior eco e destaque obtêm nos meios de comunicação) evita abordar outras teorias ou formulações que sugiram alternativas ao modelo dominante. Sobre questões como a da necessidade de reforma do sistema monetário, nem uma palavra.

Porque será que perante as evidentes incongruências geradas pelo sistema dominante (que tudo subordina ao crescimento de um indicador como o PIB) os defensores de outros conceitos, como o do desenvolvimento sustentado e o da economia do bem-estar, continuam a ser tratados como meros activistas antiglobalização ?

O que haverá de estranho em defender princípios que defendem a avaliação das políticas económicas em termos dos seus efeitos sobre o bem-estar geral, quando o que diariamente vemos em nosso redor são os efeitos de uma política económica cada vez mais orientada para o enriquecimento de uma minoria e para o empobrecimento geral?

Quando cada vez mais se fala nos problemas originados pela poluição, ela própria fruto de uma época de exploração desenfreado de recursos, porque não defender a aplicação dos princípios básicos de sustentabilidade (aqueles que ao longo de séculos permitiram à espécie humana desenvolver-se neste planeta) às políticas económicas?

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