domingo, 13 de maio de 2007

UMA SEGURANÇA PERIGOSA

A leitura desta notícia do DN, deixou-me particularmente apreensivo, não pelo essencial do seu conteúdo que até posso entender, mas cuja aplicação prática deveria ser alvo de um profundo debate.

Dizer, como o fez uma responsável do SIS, que «[m]embros da Al-Qaeda são todos os que partilham a sua ideologia e não apenas os que frequentam os seus campos de treino», assim definindo quem constitui um alvo a vigiar, pode configurar uma ameaça bem maior que a própria Al-Qaeda.

Sendo entendível o princípio de acautelar a difusão de ideias demasiado radicais, em especial quando o radicalismo envolve, ou pressupõe, formas de violência, já o simples enunciar desse princípio por aqueles a quem está cometida a tarefa de vigilância pode configurar uma forma de abuso de poder e de “julgamento em causa própria”.

Qualquer sociedade, por mais liberal que seja, não pode abdicar da necessidade de vigilância, traduzida num metódico processo de recolha e análise de informação, no sentido de prevenir a constituição de grupos que possam colocar em risco o conjunto da sociedade. É nesta lógica que, desde tempos os governantes se foram rodeando de serviços que respondessem àquelas necessidades.
Se no mundo ocidental em que vivemos vigora há séculos o princípio da separação de entre os poderes legislativos e o judicial, como entender que membros de uma organização orientada para a recolha e tratamento de informação sensível se arvorem o direito de definir quem constitui o alvo do seu trabalho?

Como se não bastasse o acréscimo do risco para o conjunto da sociedade que pode advir da ascensão ao poder nesse organismo de uma “mente” perversa – são múltiplos os casos que a história registou nesta matéria e por simplificação basta lembrar o caso do célebre John Edgar Hoover[1] que presidiu aos destinos do FBI e por essa via quase ao da nação americana – existe ainda outro não menos grave; se os poderes legislativo e executivo aceitarem silenciosamente comportamentos como o descrito na notícia, dentro em pouco teremos o SIS a exorbitar as sua tarefas e actividades, mais que não seja para justificar aumentos orçamentais.

Se, por concordância ou omissão, a sociedade deixar ao livre arbítrio dos agentes encarregues da recolha e análise de informação sensível a definição da sua missão (o que a atestar pelo teor da notícia parece estar a acontecer), não me espantará se neste momento milhares de pessoas neste país (incluindo o “Grilo” e eu próprio) não serão já alvo das suas “atenções”...

Para quem possa julgar este tipo de preocupação exagerado, recordo o que aconteceu nos EUA (o tal paradigma das liberdades individuais que tantos apregoam) onde após o 11 de Setembro de 2001 passou a ser traição questionar o que verdadeiramente aconteceu naquele dia e as detenções arbitrárias passaram a constituir regra.

Em momentos como este recordo sempre aquela história que reza mais ou menos assim: «Primeiro vieram e prenderam os comunistas! Não me preocupei, nunca fui comunista. Depois, voltaram e prenderam os sindicalistas! Também não me preocupei, nunca fui sindicalizado. Novamente vieram e prenderam os padres! Nunca fui católico, portanto foi coisa que não me preocupou. O pior é que agora levam-me a mim... e eu não sei porquê!»
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[1] John Edgar Hoover – (1895 – 1972) integrou os quadros do FBI (a mais importante organização policial do mundo) como director durante 48 anos, dos quais 37 como seu director principal. Durante a sua permanência à frente daquele organismo de combate ao crime alternou entre fases de combate eficaz ao crime organizado até à total paranóia de controlo de congressistas e a perseguição de líderes do movimento negro e dos movimentos anti-guerra do Vietname. Para a história ficou também a sua associação aos até agora mal explicados assassínios do líder negro Martin Luther King, do presidente John Kennedy e do seu irmão, o congressista e candidato presidencial Robert Kennedy. Todos estes factos terão estado na origem de, após uma longa carreira em que foi praticamente intocável, no final de sua vida ter passado a ser alvo de críticas da sociedade. (adaptado de Wikipedia)

1 comentário:

antonio ganhão disse...

Atravessamos tempos em que a necessidade se sobrepõe à natural cautela com que devemos encarar os grandes remédios.

A europa espalha CITs pelas suas fornteiras, para acolher e instalar os emigrantes ilegais.

Este acolhimento passa por os deter sem culpa formada, por lhes negar o acesso a um advogado e sem limite temporal para a sua detenção.

Estes homens e mulheres não estão muito lomge das condições em que se encontram os detidos em Guantánamo.

Só que ninguém parece ver...