Há alguns anos
que se vêem acumulando os sinais de mudança com as organizações cada vez mais
empenhadas na redução dos custos de produção a optarem seja pela extinção pura
e simples de postos de trabalho, seja pela redução de salários ou pela
automação dos postos de trabalho. Enquanto se desenvolvem estes processos de
redução das necessidades de mão-de-obra (uns mais forçados que outros) a
sociedade em geral mantém a mesma perspectiva de abordagem que remonta à
transição do século XVIII para o XIX e aos tempos da Revolução Industrial.
Mantendo o
paradigma de vilanizar todos os que – na ausência reiterada de trabalho ou por
opção própria – se não inserem num mercado de trabalho dito normal,
transformando-os em párias da sociedade, não estaremos apenas a ostracizar uma
parte dos cidadãos, tão digna quanto qualquer outra, mas principalmente a
contribuir para o agravamento do mal-estar geral da sociedade e a escamotear o
verdadeiro cerne do problema.
Tratar os
sem-emprego como párias ou vadios inúteis desvia as atenções do facto das
sociedade modernas se organizarem preferencialmente em torno do valor dinheiro,
tratando os indivíduos como meras peças numa engrenagem concebida para a acumulação
de lucros, esquecendo que, por manifesta escassez de mercados compradores, a
pauperização de sectores cada vez maiores da sociedade só poderá culminar na
redução desses lucros; no limite até as grandes empresas encerrarão por não
encontrarem compradores para as mercadorias que produzem a custos ínfimos
graças à redução dos postos de trabalho, dos salários ou da automação.
O
reconhecimento desta espiral depressiva, agravada pelas elevadas taxas de
desemprego-jovem e pela quase completa ausência de políticas que as contrariem,
levou-me em tempos a escrever no “post”
«A CRISE, O EMPREGO E O RENDIMENTO»,
que «[c]omprovado
o fracasso prático de estímulos fiscais e outras medidas pontuais, como forma
de redistribuição da riqueza, torna-se cada vez mais óbvia a necessidade de
trazer para o debate outras vias para o atingir. A primeira e mais óbvia – a do
aumento generalizado dos salários – será naturalmente recebida pelas
associações patronais e pelos defensores do liberalismo económico como mais uma
inaceitável intromissão do Estado na esfera privada e no livre funcionamento do
mercado; assim, só resta ponderar a hipótese de criação de um modelo assente na
distribuição de um rendimento garantido, segundo o princípio do pagamento de um
dividendo “per capita” em função do PIB.
Para quem comece já a questionar sobre a viabilidade
de semelhante medida, recordo que modelos desta natureza estão actualmente em
vigor e que um dos locais onde isso acontece é nos EUA, ou melhor no estado do
Alasca, onde desde o início do processo de exploração petrolífera e como forma
de tentar fixar definitivamente muita da mão-de-obra que para lá se deslocou
para a realização das infra-estruturas petrolíferas, foi decidida a criação de
um fundo (o Alaska Permanent Fund) alimentado pelas receitas das concessões
petrolíferas cujo rendimento anual é distribuído pelos residentes.(…)A consagração universal do princípio da distribuição
de um rendimento garantido não constitui apenas uma medida de combate à crise
económica; será, além de uma medida de justiça social (o PIB resulta da
contribuição de toda a população para a produção nacional, pois se os que têm
emprego contribuem de forma directa, os que o não têm contribuem indirectamente
por via do consumo), uma boa forma de começarmos a preparar-nos para um futuro
em que, graças aos desenvolvimentos tecnológicos e aos ganhos de produtividade,
dificilmente existirão empregos para toda a gente.»
Se já em
Fevereiro de 2009 avancei a necessidade de equacionarmos novas abordagens para
o problema da redistribuição da riqueza, agora que constatamos na prática os
efeitos da fracassada “austeridade expansionista”, que somos alertados por um
claro aviso do Banco Mundial e que a situação das elevadas taxas de
desemprego-jovem não deixa perspectivar nada de muito positivo – em Janeiro de
2010, no “post” «OS
JOVENS NÃO SÃO “LEMMINGS”», deixei a dúvida de saber «[a]té quando iremos esperar para ver melhorar a situação das gerações que a
nossa inépcia condenou (e continua a condenar) a vegetarem numa sociedade cada
vez mais egoísta, onde os objectivos individuais continuam a sobrepor-se aos
colectivos e onde os que não alcançarem o sucesso (que pode até ser apenas um
trabalho digno e adequadamente remunerado) continuam a ser vistos como
marginais. Quanto tempo sobreviverá uma sociedade onde as gerações futuras
continuam a ser encaradas apenas como uma submissa reserva de mão-de-obra
barata?»
- quando se confirma que «Portugal
é um dos países da OCDE onde a percentagem de jovens que não estudam nem
trabalham mais tem crescido», já estará esgotado o tempo de espera.