segunda-feira, 29 de setembro de 2008

OS DEUSES ESTÃO LOUCOS

A minoria republicana votou, no Congresso, contra a o plano Paulson proposto pelo presidente Bush (republicano) para salvar os bancos norte-americanos…

Independentemente da questão sobre a eficácia da proposta de disponibilizar 700 mil milhões para “socorrer” uma Wall Street devastada pela sua própria cupidez e de estimar se, caso tivesse sido aprovado, aquele montante seria ou não suficiente, não deixa de fazer sentido questionar a razão daquela votação.

Será, como procurou explicar hoje nos ecrãs da SIC o seu correspondente nos EUA, Luís Costa Ribas, que a orientação da votação foi apenas fruto dos receios individuais dos congressistas poderem não vir a ser reeleitos? ou existirão outras razões?

George W Bush estará talvez a estas horas a interrogar-se sobre o resultado (dificilmente estará a arquitectar alguma alternativa) se é que não está a vituperar os colegas republicanos do senado que optaram por uma arrojada jogada de apoio à eleição de McCain (deixo a resposta para os especialistas em política interna americana e para o rescaldo das eleições), ou a pensar que os deuses estão loucos…

O PÂNICO DA NORMALIDADE

Depois de longas semanas alheado das questões económicas – o seu território por eleição ou não tivesse ele sido o dilecto conselheiro para os assuntos económicos durante a passagem de Cavaco Silva pela chefia do governo – eis que hoje João César das Neves voltou àquele tipo de temas nas suas crónicas semanais no DIÁRIO DE NOTÍCIAS, com «A NORMALIDADE DO PÂNICO».

E em boa hora o fez, pois era indispensável já se ter ouvido o seu comentário sobre a actual conjuntura económica; não tanto pelo que poderia constituir de novidade (há muito são conhecidas as suas profundas e arreigas ligações às teses monetaristas de Milton Friedman e da Escola de Chicago) mas pela sua enorme capacidade para explicar o óbvio.

Tal como seria de esperar o ilustre professor não desiludiu. Sobre a crise financeira que grassa em Wall Street, César das Neves explica que «...uma dúvida forte constitui vírus fatal para qualquer sistema financeiro» e que esta «...é a razão das catástrofes que de tempos a tempos devastam a paisagem económica...», daqui a concluir-se que tudo não passará de uma tempestade num copo de água é um apenas um passo. Assim pensando, é natural que sobre a debilidade do tecido económico norte-americano, devastado por uma desastrosa política de deslocalizações, ou sobre a fragilidade de uma divisa enfraquecida por sucessivas intervenções militares (e pelo agravamento do deficit externo que aquelas acções militares implicam) e desacreditada por uma política externa irracional, não tenha escrito uma única palavra.

Sinceramente duvido que este silêncio resulte apenas das convicções monetaristas do autor, pois é do mais elementar senso comum que as “crises de confiança” não têm apenas origem nos movimentos bolsistas, mas antes reflectem, por mais absurdos que eles sejam, outros factores.

O discurso de César das Neves vem aliás, na linha de outros que continuam a afirmar que a Grande Depressão resultou do “crash” bolsista de 29 de Outubro de 1929 e não do estado geral da economia norte-americana que apresentava já evidentes sinais de estagnação e mesmo quando aparenta ter alguma razão na argumentação – as crises «...nascem sempre de erros, imprudências, tolices» – de pronto comete o erro de confundir a árvore com a floresta quando assevera que «...é inevitável que por vezes tais deslizes aconteçam», esquecendo, ou querendo que os seus leitores esqueçam, que grande parte da dimensão da actual crise financeira resulta do uso e abuso de elaborados produtos financeiros que mais não procuram que aumentar a “parada do jogo” em que se transformaram os mercados de capitais a nível mundial.

Não será pois de espantar que, contrariamente ao que pretende o autor, a apreciação popular seja particularmente severa com o sector financeiro; é que a tantas vezes vituperada sabedoria popular sabe o que os grandes banqueiros parecem ter há muito esquecido: as árvores não crescem até ao céu!

Assim, mesmo que tenha razão quando diz que esta crise não difere muito de tantas outras, ninguém deverá estar muito receptivo ao ponto de vista optimista de que «...a situação até é benigna, comparada, por exemplo, com os desastres no Leste da Europa há 20 anos», porque, como César das Neves bem sabe a origem das duas crises é totalmente distinta. A crise que viveram os territórios da antiga União Soviética, como tão bem o demonstrou Joseph Stiglitz[1], foi fruto das inadequadas políticas financeiras e de privatização indiscriminada e apressada do tecido económico, determinadas pelo FMI (na linha da escola de pensamento que César das Neves segue) e pelos financeiros de Wall Street e não, como agora sucede, em consequência da degradação da economia norte-americana e do culminar de um período de desenfreada especulação.

Por isso é que, por melhor intencionadas que sejam as intenções de César das Neves, se torna cada vez mais difícil esperar que os cidadãos contribuintes aceitem de bom grado que é do seu interesse «...evitar que dúvidas sobre bancos particulares passem para a moeda que todos usamos» o que implica «...traçar uma linha controversa entre as instituições que podem falir e as que, por criarem contágio global, são consideradas grandes demais para morrer», como pretende. È que mesmo salvaguardando o princípio de que «...os gestores e accionistas envolvidos devem perder» não avança qualquer argumento para explicar a defesa da manutenção do funcionamento do mercado nos moldes actuais, salvo um implícito pânico da normalidade que seria uma salutar redução do peso da esfera financeira, face à dimensão das reais necessidades de financiamento do crescimento económico.

Mas isso, seria pedir o Céu na Terra que é algo de abominável para os mais crentes.
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[1] A confirmação desta afirmação pode ser encontra no livro de Joseph Stiglitz «GLOBALIZAÇÃO – A GRANDE DESILUSÃO» onde o ex-conselheiro económico de Bill Clinton, ex-vice-presidente do Banco Mundial e Prémio Nobel de Economia em 2001 e professor de economia na Universidade de Columbia, analisa os efeitos das políticas do Consenso de Washington (conjunto de medidas acordadas entre o FMI, o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, que passou a constituir a solução-tipo usada pelo FMI para promover a estabilidade macroeconómica dos países em desenvolvimento que passavam por dificuldades e que, entre outras, impunham regras de disciplina fiscal, de redução dos gastos públicos, de reforma tributária, de controlo das taxas de juro e de câmbios, de abertura dos mercados e ao investimento estrangeiro, a privatização das empresas públicas e a desregulamentação dos mercados de capitais).

domingo, 28 de setembro de 2008

O COLAPSO DE WALL STREET (parte II)

Insistir hoje na ideia de que a crise financeira que atravessamos resulta do rebentamento da bolha especulativa do imobiliário norte-americano é, não apenas, um erro grosseiro de análise como uma óbvia manobra de branqueamento de responsabilidades, como procurei demonstrar na primeira parte deste “post”.

As soluções apresentadas por personalidades demasiado próximas do poder político e económico não podem, obviamente, indicar um caminho diferente daquele que propõem – o recurso a fundos públicos, ou seja, originados nos impostos cobrados para colmatar os prejuízos encaixados pelo sistema financeiro que, em reacção a estes, ameaça estrangular o conjunto da economia.
Depois das economias ocidentais terem registado duas décadas em que, em nome do sacrossanto mercado e do dogma da sua infalibilidade, assistimos à privatização de toda e qualquer actividade pública que se configurasse geradora de lucros e após quase um século de concentração dos capitais no sector financeiro, eis que este regista mais uma crise originada no seu funcionamento antropofágico e... cúmulo da ironia, encontra a salvação na intervenção do Estado.

A opção assumida pela administração norte-americana constitui, à luz das suas próprias teorias, um evidente contra-senso e, podendo ser entendível no pressuposto de que a sua intervenção no sistema financeiro, impedindo a falência de uma empresa financeira privada evitará a propagação de uma onda de falências ao conjunto dos outros sectores da economia, é dificilmente sustentável no âmbito mais geral das regras de funcionamento de uma economia de mercado e poderá constituir factor de instabilidade noutros sectores económicos afectados por crises (se as empresas financeiras são intervencionadas, porque não as outras?).

Esta questão da intervenção pública justifica ainda outras questões, que vão desde a sua eficácia até à sua duração e dimensão[1], uma vez que os fundos originados nos contribuintes não são ilimitados, nem estes agentes económicos irão estar receptivos a assistir à delapidação das contas públicas em exclusivo benefício do sector financeiro.

Wall Street poderá ter sobrevivido aos primeiros abanões que a sua própria imprevidência originou, mas qual deverá ser o seu futuro?

É que se algo ficou cabalmente demonstrado com toda a agitação que tem vivido o coração financeiro do mundo é que este (ou qualquer outro) não pode continuar a funcionar como se nada de mais tivesse ocorrido.

Após a Grande Depressão de 1929, fenómeno que há quase um ano abordei aqui[2], a economia registou outros períodos de recessão e de crise financeira sem que os seus efeitos se tenham revelado tão dramáticos quanto os actuais. Nem o fracasso do LTCM[3], nem a bolha das DOTCOM[4], nem a falência da ENRON[5] originaram no sistema financeiro semelhante onda de choque, como a que está a provocar a conjugação do rebentamento da bolha do imobiliário (originada nos elevados volumes de créditos de alto risco – “subprime” – concedidos às famílias americanas) com o efeito multiplicador criado pelos complexos produtos financeiros (derivados) construídos com base naquele tipo de créditos e vendidos como se de produtos de cobertura de risco ou de risco baixo se tratassem.

Com a tomada de consciência da disseminação de produtos de elevado risco e na quase impossibilidade de uma rápida diferenciação entre estes (daí a designação de produtos sofisticados) os parceiros financeiros limitaram-se a agir de acordo com os manuais... e simplesmente limitaram o volume de crédito que habitualmente concediam entre si. ~

Na essência pode-se dizer que as empresas financeiras funcionam como se de um vulgar jogo de pirâmide[6] se tratasse; enquanto o sentimento dominante foi o da confiança não faltavam créditos nem novos parceiros desejosos de “entrar no jogo”, mas aos primeiros sinais da sua falta cada um tratou de contabilizar os respectivos ganhos e esperar.

Não é por isso de estranhar que imediatamente após o anúncio do plano Paulson os mercados tenham sentido uma onda generalizada de euforia e registado subidas consideráveis num único dia de negociação[7]...

para de pronto registarem quedas quando, no dia seguinte “alguém” se apercebeu que ainda faltava muito para a aplicação daquele plano.

Às dúvidas políticas, prontamente apresentadas na própria sessão de apresentação do plano no Senado norte-americano, de ambas as bancadas (democratas e republicanos), como refere esta notícia da BBC, outras têm sido colocadas por vários sectores da vida política, económica e académica norte-americana e mundial.

A fragilidade do plano Paulson, que na essência não representa mais que uma bóia de salvação para os banqueiros, chega até a merecer reparos do Director-geral do FMI, Dominique Strauss-Khan, que num artigo no LE MONDE que propõe uma solução alternativa e menos onerosa – a emissão de “swaps” de longo prazo de títulos hipotecários (os tais que figuram no balanço dos bancos e cujo valor se reduziu a quase zero) contra títulos do tesouro – que, segundo o autor, permitiria sanear o balanço dos bancos e mantém nestes o risco não o transferindo para os contribuintes.
No conjunto, qualquer uma destas soluções inclui um processo de branqueamento da actuação irresponsável dos dirigentes das empresas financeiras e do comportamento laxista das entidades de supervisão
[8] e das empresas de notação de risco; de forma mais ou menos intencional, todos contribuíram para o eclodir de uma situação que agora não parecem capazes, ou dispostos, a resolver.
Mais crítico que Strauss-Kahn é George Soros
[9], que num artigo publicado no FINANTIAL TIMES chama a atenção para a parcialidade de uma proposta que se limita a abordar o lado financeiro da crise e esquece a necessidade de intervir, por exemplo, sobre o próprio mercado imobiliário. Esta posição é tanto mais relevante quanto o seu autor é um dos mais conhecidos especuladores a nível mundial e de modo algum se pode considerar como um crítico do sistema vigente em Wall Street.

Entre defensores convictos e adversários cépticos mantém-se a discussão sobre a aprovação do plano de recuperação; enquanto prosseguem os contactos entre republicanos e democratas para delinearem os contornos finais da tábua de salvação do regime, o BLOOMBERG dava hoje como segura a sua aprovação para muito breve (tudo indica que vamos voltar a ter um domingo de grandes notícias) e o mundo aguarda para saber até onde irá a “boa vontade “ do Congresso norte-americano.
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[1] Isto mesmo pode ser confirmado nesta notícia do DIÁRIO ECONÒMICO que citando como fonte um notícia do BLOOMBERG assegura que o «SALVAMENTO DO SECTOR FINANCEIRO DOS EUA PODE CUSTAR SETE VEZES MAIS»; a informação baseia-se numa entrevista de Marc Faber, fundador e presidente da empresa de consultoria em investimentos MARC FABER, LDA, onde este afirma que o valor real poderá ser de 5 biliões de dólares.
[2] Devido à extensão do texto dividi-o em duas partes que podem ser lidas aqui e aqui.
[3] Long-Term Capital Management (LTCM) foi um “hedge-fund” criado, em 1994, por John Meriwether (que fizera carreira na Salomon Brothers) destinado à prática de arbitragem entre os títulos de renda fixa (obrigações públicas). Baseado no principio de que a longo prazo as taxas das diferentes dívidas públicas tenderiam para valores iguais, mas a velocidades diferentes, esta estratégia granjeou resultados fabulosos (cerca de 40% ao ano) nos primeiros tempos, até que em Setembro de 2008 se registou uma corrida aos resgates que não tendo sido acompanhada pela corresponde redução da exposição acarretou um prejuízo de mais de 3 mil milhões de dólares e a necessidade de intervenção das autoridades americanas
[4] DOTCOM foi a designação pela qual ficou conhecida uma bolha especulativa em torno das recém criadas indústrias das tecnologias de informação. Iniciou-se em meados dos anos 90 e durou até ao seu pico em Março de 2000 quando o acumular de maus resultados pelo sector das tecnologias de informação levou a uma desvalorização sucessiva das cotações em bolsa.
[5] A ENRON foi uma empresa americana do sector da energia que além de líder mundial no sector era conhecida pelos enormes lucros gerados e pela classificação da empresa americana mais inovadora que a revista Fortune lhe atribui durante seis anos consecutivos, até queem finais de 2001 se descobriu um os gigantesco processo de manipulação da sua contabilidade, que ficaria conhecido pelo “Escândalo ENRON”, que transformaria o seu nome em sinónimo de fraude e corrupção e que além de outros prejuízos ditou ainda o desaparecimento da mundialmente conhecida empresa de auditoria Arthur Andersen.
[6] Esta é a designação comum para um esquema que consiste na troca de dinheiro entre os participantes de forma que os recém-chegados alimentam um fundo distribuído pelos participantes mais antigos. Na essência este esquema funciona enquanto o número de novos aderentes for crescendo de forma exponencial relativamente aos mais antigos. Também é conhecido pela designação de Esquema de Ponzi (em homenagem ao seu criador, o italiano Charles Ponzi) e em Portugal ficou popularizado, nos anos 80 do século passado, pela sua associação ao nome de Dona Branca.
[7] Entre outras ver, sobre o mercado nacional, esta notícia do JORNAL DE NEGÒCIOS, esta do PUBLICO e esta do DIÁRIO ECONÒMICO; sobre os mercados internacionais ver esta notícia da BBC que apresenta uma interessante perspectiva gráfica dos principais índices mundiais.
[8] Refira-se que na fase inicial do desenvolvimento de instrumentos financeiros como os CDS, o então presidente do FED, Alan Greenspan, opôs-se veementemente a qualquer tentativa de supervisão sobre aquele tipo de produtos.
[9] De naturalidade húngara e de ascendência judaica, Soros tornou-se mundialmente conhecido enquanto especulador quando em 1992 forçou o Banco de Inglaterra a desvalorizar a Libra e a abandonar o sistema de câmbios fixos. Actualmente é o Presidente da Soros Fund Management e do Open Society Institute.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

O COLAPSO DE WALL STREET (parte I)

Ninguém de boa-fé negará que vivemos tempos crescentemente complicados.

Depois da queda do Muro de Berlim, em 1989, e do concomitante anúncio do fim da história[1], ampliado por um grupo de fanáticos crentes no “american way of life” e no absolutismo de um liberalismo económico levado ao absurdo, o Mundo assistiu ao 11 de Setembro de 2001 e às invasões americanas do Afeganistão e do Iraque (abrindo um conflito directo com o designado fundamentalismo islâmico). A esta agitação geo-estratégica e perante uma plêiade de governantes europeus cada vez mais convertidos às maravilhosas vantagens de uma globalização ao gosto norte-americano, seguiu-se em 2007 o eclodir de uma crise financeira originada no mercado imobiliário norte-americano, que assume já proporções incomensuravelmente maiores graças à alavancagem resultante do contágio pelos sofisticados produtos financeiros que Wall Street disseminou por todo o mundo.

Perante este cenário (descrito de forma muito rápida e sucinta) e quando se fazem ouvir as vozes mais díspares não posso deixar de trazer as mais recentes declarações do presidente da nossa república sobre os previsíveis efeitos da crise financeira sobre a economia nacional.

Com os pés bem assentes no epicentro do desastre, Cavaco Silva assegurou que a crise nos vai atingir, à semelhança do que acontecerá aos contribuintes norte-americanos[2] e que pretende aproveitar a sua presença em Nova York para “ouvir” o que pensa Wall Street.

Acrescentou ainda que tem alguma ideia do que originou a crise - reguladores, supervisores, bancos centrais, a invenção que se fez de produtos financeiros[3] - mas é preciso esperar para ver qual a reacção ao plano da administração de George W Bush.

Este tipo de análise e de comentários poderá “ficar bem” e até ser entendida num político qualquer, mas de um dos mais reputados economistas nacionais tem que se esperar mais e muito melhor. Não basta referir vagamente o efeito de contágio originado pelos veículos financeiros (leia-se produtos derivados e de securitização de créditos que englobando activos com níveis de risco muito díspar foram classificados pelas agências de “rating” como se de produtos de baixo risco se tratassem) e esperar ouvir dos responsáveis pela situação uma opinião abalizada para a resolver.

Assumir publicamente uma postura anódina é algo a que os políticos (de pacotilha) de quase todos os quadrantes (da direita à esquerda, nacionais e internacionais) nos têm habituado, mas agora o que importa é exigirmo-lhes respostas claras e que de forma rigorosa permitam aos eleitores determinar quais os que pretendem manter em vigor este modelo de desenvolvimento que está a conduzir a economia (e a esmagadora maioria das pessoas) para um precipício e os que, reconhecendo as origens do problema, se mostrem efectivamente empenhados na correcção dos erros e na construção de alternativas que impeçam a sua repetição.

É que apontar o dedo aos banqueiros (incluindo os todo-poderosos presidentes dos bancos centrais) e optar por lhes financiar a ganância e os erros, mediante o recurso a fundos públicos que são suportados pelo “bolso” dos contribuintes, sem a correcção das regras que conduziram à actual situação e continuando a incensar as virtualidades do “mercado” para corrigir os desvios, equivale a invocar a protecção divina em situações de catástrofe e a oferecer santuário aos prevaricadores. Exemplo disto mesmo foi a reacção dos mercados pós o anúncio do plano da administração Bush (plano Paulson), que sem qualquer justificação real registaram uma subida generalizada e espectacular das cotações numa única sessão, para na sessão seguinte voltarem à tendência de queda, único comportamento lógico face à actual conjuntura financeira e à total ausência de soluções à vista.

A tibieza dos políticos (ou o seu simples enfeudamento aos interesses do sector financeiro) tem-se revelado não só na forma como têm abordado – ou simplesmente fingido que não vêem – os problemas originados por uma crise que muitos especialistas comparam com a que ficou para a história como a Grande Depressão, mas também na forma como os diferentes responsáveis têm procurado eximir-se às responsabilidades que lhes cabem, de que pode servir de exemplo a recente notícia do LE MONDE que anuncia que está em curso uma investigação policial (pelo FBI) a eventuais práticas de falsa informação ao mercado e às autoridades de supervisão.

A extensão da crise é de tal magnitude que o director-geral do FMI, o francês Dominique Strauss-Khan[4], se lhe refere num artigo de opinião publicado no LE MONDE, como crise sistémica e apela ao desenho de uma solução global e à reformulação da regulamentação que rege os mercados de capitais. Não se tratando o autor de nenhum crítico do sistema económico liberal, a sua proposta é tanto mais relevante quanto aponta para a manifesta insuficiência das políticas até agora seguidas – constante injecção de liquidez no mercado interbancário e proposta de intervenção pública para a aquisição dos activos desvalorizados – e para a necessidade de uma intervenção mais profunda.

Como qualquer bom aluno, Strauss-Khan inibe-se de criticar quer o recurso às injecções de liquidez ou até o plano Paulson – que na essência não representam mais que um aval das práticas de especulação e de mistificação do risco que nos últimos anos se tornaram apanágio dos sistema financeiro – mas sempre vai apontando aquela que deve ser a preocupação principal de quem queira impedir a repetição dos erros.
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[1] Referência às teses de Francis Fukuyama que sustentam que com a queda do Muro de Berlim, o fim do conflito leste-oeste e a emersão dos EUA como potência hegemónica, a democracia liberal ocidental constitui o culminar da história da humanidade.
[2] Cavaco Silva estará a referir-se ao plano de salvamento proposto pelo secretário de estado do Tesouro dos EUA, Henri Paulson, que prevê um gasto de 700 mil milhões de dólares para sanear os balanços dos bancos
[3] A resposta foi publicada aqui, pelo DIÁRIO DE NOTÍCIAS, e aqui, pelo DIÁRIO ECONÓMICO.
[4] Político francês, de origem judaica, professor de economia, ex-ministro das finanças no governo do também socialista Lionel Jospin, foi candidato à nomeação pelo PS para concorrer ao Eliseu contra Laurent Fabius e Ségolène Royal. Com a vitória presidencial de Nicolas Sarkozy (que bateu a candidata socialista Ségolène Royal) Strauss-Khan viu-se recompensado com a nomeação para a direcção do FMI.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

FALTAM MEIOS E VONTADE

Uma notícia do DIÁRIO ECONÓMICO do final da passada semana veio confirmar o adiamento das datas para entrega das propostas finais dos concursos para as anunciadas auto-estradas Transmontana e do Douro Interior.

Embora na semana anterior o ministério tutelado por Mário Lino tivesse difundido uma nota refutando a afirmação de que as auto-estradas a concurso implicam mais investimento do que o anunciado, na actual conjuntura mundial, a notícia que a «crise faz subir custos com estradas» (publicada no passado dia 19 pelo DIÁRIO DE NOTÍCIAS) tem todo o sentido. Não só a crise financeira está a forçar os bancos a reduzir os riscos, como está a provocar reconhecidos problemas de liquidez (vejam-se as constantes injecções de moeda pelos bancos centrais e as contínuas notícias de fusões ou falências de bancos), fenómenos que obviamente não podem deixar de afectar o tecido bancário nacional.

E isto nem sequer é um fenómeno que se limite ao âmbito nacional, pois a atestar por uma notícia do NEW YORK TIMES, de há cerca de dois meses, a entidade que gere o projecto de reconstrução do World Trade Center – Port Authority of New York and New Jersey – debatia-se precisamente com o mesmo tipo de dificuldades financeiras. O projecto de construção da Freedom Tower, orçado em 3 mil milhões de dólares, encontra-se próximo do impasse e a decisão do Merril Lynch de abandonar a anunciada intenção de se vir a instalar no edifício foi fruto dos resultados negativos apresentados em consequência da crise do “subprime”.

Se em Julho as perspectivas eram más, que dizer agora que aquela financeira já foi comprada pelo BANK OF AMERICA e quando se levantam dúvidas sobre o projecto inicialmente apoiado pelo JP MORGAN CHASE para a construção de outro edifício na zona depois deste ter adquirido o BEAR STEARNS.

Fortemente afectada pela crise financeira, Wall Street estará a reequacionar as suas estratégias e, seguramente, a opção do investimento imobiliário é das menos importantes e atractivas, no momento…

Mas a questão do adiamento da atribuição das novas concessões merece uma atenção mais detalhada.

As hesitações dos normais candidatos a este tipo de projectos não é apenas revelador das dificuldades financeiras que estarão a encontrar ou a recear, mas também da evidente divergência de interesses entre o Estado e os concorrentes. Se as concessões a concurso não se situassem no interior do território (quiçá nalgum dos “desertos” do ministro Mário Lino) as construtoras envolvidas no processo não revelariam tantas hesitações nem receios, demonstrando assim que contrariamente ao que continuam a defender os apóstolos do neoliberalismo a iniciativa privada não constitui uma efectiva (e adequada) alternativa ao papel do Estado.

E ainda serão precisos mais argumentos para questionar a validade e a viabilidade de projectos como o do NAL e do TGV?

sábado, 20 de setembro de 2008

BURACO NEGRO

O contínuo fluxo de notícias sobre as dificuldades que atravessa o sector financeiro internacional parece confirmar as perspectivas mais sombrias que alguns analistas[1] vinham apresentando desde meados de 2006.

Assim, quem pensou que após o apoio governamental às negociações que conduziram à entrada dos chineses do CITIC no capital do MORGAN STANLEY[2], à aquisição do BEAR STEARNS pelo JP MORGAN e a do MERRILL LYNCH pelo BANK of AMERICA a crise poderia estar minimizada, terá sofrido uma profunda desilusão quando o Tesouro americano anunciou a intervenção no FANNIE MAE e no FREDDIE MAC (os dois principais financiadores de bancos e outras empresas financeiras que concedem créditos hipotecários às famílias americanas) e se respirou com algum alívio à decisão da administração Bush de não contrariar a falência do LEHMAN BROTHERS, confiando nas virtualidades do mercado para resolver e absorver os efeitos da turbulência, que grande decepção terá sentido com a notícia de mais uma intervenção, agora na seguradora AIG.

E este cenário não se limita ao mercado norte-americano. Também o sistema financeiro inglês, fortemente atingido pela excessiva especulação imobiliária, já assistiu à nacionalização do NORTHERN ROCK[3] e nesta última semana, à compra apressada do HBOS (HALIFAX BANK OF SCOTLAND) pelo LLOYDS TSB[4].

É que se os primeiros sinais de fragilidade do sector bancário pareceram de fácil resolução (o FED e outros bancos centrais não têm parado de injectar biliões de dólares – qual colchão para aparar a queda, como muito a propósito o retrata o humorista Chappatte – nos mercados interbancários, enquanto vão ajustando as taxas na expectativa de atenuar a quebra de confiança que grassa naqueles mercados) o seu contágio para o sector segurador veio dar maior credibilidade aos cenários mais negativos e confirmar que se a origem da crise pode ser imputada à falência do mercado do “subprime” norte-americano, o seu desenvolvimento e aprofundamento deve-se exclusivamente ao mercado de incomensurável risco que constituem a profusão dos sofisticados produtos derivados que as empresas financeiras criaram e com os quais inundaram um mercado alheio às respectivas características e incapaz de avaliar (e prevenir) os respectivos riscos.

A miscigenação entre activos com níveis de risco muito díspares, a falta de “know how” de muitos dos operadores que negoceiam estes produtos e uma quase total ausência de escrúpulos (em grande parte determinada pela absurda regra da sobrevalorização dos resultados e do pagamento de chorudos prémios) por parte dos responsáveis pelas principais entidades financeiras, facilitada pela ausência de regulamentação destes mercados, terá estado na origem do efeito de contágio e de expansão da crise iniciada no mercado do “subprime”.

A grande sofisticação deste tipo de produtos financeiros e a sua difusão como se de um produto de cobertura de risco se tratasse, originou uma rápida e vasta dispersão pelas contas de quase todos os bancos por esse mundo fora. Ainda hoje quando se ouvem ou lêem declarações de políticos e de administradores de bancos que asseguram a reduzida exposição das suas economias (e das entidades financeiras que nelas operam) àquele tipo de produtos deverá continuar a ser encarada com as devidas reservas, na medida em que continuam por apurar os montantes envolvidos naquelas transacções e, inclusive, quais os instrumentos financeiros que integram ou não activos daquele tipo.

Para complicar ainda mais esta situação, o recente anúncio pelo secretário de estado do Tesouro da administração Bush, Henry Paulson, e pelo presidente do FED, Ben Bernanke, de que está em preparação um plano para a criação de uma agência governamental destinada a assumir as dívidas das instituições financeiras resultantes da crise que se atravessa, é um puro reconhecimento do fracasso da estratégia por eles seguida até agora e uma clara confirmação de que a vaga de falências não resulta apenas do rebentamento da bolha especulativa formada à volta do “subprime”.

Indiferentes aos esforços do FED, os mercados de capitais continuaram a registar quedas significativas, sendo de destacar as do GOLDMAN SACHS e do MORGAN STANLEY que pelo seu valor já são apontados como os próximos “gigantes” a cair, que talvez nem a irracional “euforia” da última sessão de bolsa da semana consiga evitar.

É que se para alguns analistas a espectacular recuperação da última sexta-feira constitui uma reacção natural e positiva ao anúncio da criação da agência de garantia e da decisão da SEC (o regulador do mercado norte-americano) de impor limitações à prática do “short selling”, para outros a iniciativa governamental vai demorar muito tempo até ser implementada (nunca antes do início do próximo ano e da entrada em funções da administração que será eleita em Novembro) e o sucesso que conheceu em anteriores crises pode não se repetir devido às características dos activos agora envolvidos.
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[1] Entre estes destaquem-se em especial os trabalhos que o “think tank” europeu LEAP apresentou e onde desenvolveu uma sequenciação para os acontecimentos que temos vindo a assistir.
[2] Notícia mais recente do DIÁRIO ECONÓMICO refere mesmo uma próxima fusão do Morgan Stanley com o Wachovia e posterior venda do conjunto ao CITIC
[3] Curioso o título da notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS que aproveitou para referir que o Northern Rock custa 4660 euros a cada inglês.
[4] Ver aqui a notícia do GUARDIAN.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

O PREÇO DOS COMBUSTÍVEIS

Não foi desprovido de curiosidade que li a notícia do EXPRESSO on line sobre o «Preço dos combustíveis», tanto mais que esta se centrava na abalizada opinião de Paulo Portas sobre o assunto.

Conhecida a habilidade deste insigne político nacional para cavalgar qualquer onda política que lhe proporcione a visibilidade que as suas naturais aptidões não lhe conseguem garantir, não é de estranhar que venha agora abordar uma questão que volta à ordem do dia nacional – o desajustamento entre os anunciados preços internacionais do “crude” e os dos combustíveis vendidos no mercado nacional. Também não é estranho que, agora que o preço do “crude” desce, como quando o mesmo preço subia perdure o sentimento generalizado de que algo não “bate certo” neste mercado.

Tal como o escrevi noutras oportunidades[1], a questão não se resume a avaliar a correlação entre a variação do preço internacional do “crude” e o preço para o consumidor final dos combustíveis, nem a medir o efeito resultante da oscilação das divisas envolvidas na operação (os contratos sobre o “crude” são fixados em dólares americanos e o preço dos combustíveis em Portugal é fixado em euros) ou se reduz à vigilância da Autoridade da Concorrência (que obviamente mais não pode fazer que avaliar a existência de eventuais práticas de abuso de concorrência[2]) mas à questão que reside no processo de formação interna dos preços.

Assim, a risível proposta de Paulo Portas para que o ministro da economia, Manuel Pinho, explique o injustificável, constitui apenas uma manobra de propaganda à qual é fácil augurar um nulo efeito económico e um reduzido resultado político e é tanto mais ridícula quanto o seu autor foi ministro de estado e da defesa do governo (chefiado por Durão Barroso) responsável pela publicação da portaria[3] que liberalizou os preços dos combustíveis e em cujo preâmbulo se pode ler: «[o]s preços dos combustíveis «...» têm estado sujeitos a um regime de preços máximos de venda. Apesar de esses preços variarem essencialmente em função dos custos do petróleo, dos limites do imposto (ISP) e haver liberdade de fixação de preços abaixo do limite máximo, tem-se verificado que esse limite tem funcionado como preço de referência, adoptado pela generalidade dos revendedores. Essa prática conduz aos efeitos que um regime de preços administrativos teria, com a consequente ausência de desejável concorrência e dos benefícios para os consumidores. Seguindo a linha programática do Governo, considera-se oportuno que a política de preços da energia, e em particular dos combustíveis, assuma um carácter cada vez mais liberalizador, a exemplo do que já ocorreu nos outros Estados membros da União Europeia. Assim, a gasolina sem chumbo 95, o gasóleo rodoviário e o gasóleo colorido e marcado deixam de estar sujeitos ao regime de preços máximos de venda ao público, favorecendo a concorrência no sector».

Como tão beatificamente propunha o citado diploma, a iniciativa da liberalização pressupunha a criação de condições para o aumento da concorrência e benefícios para os consumidores; porém, como muitas vezes o tem referido Joseph Stiglitz (ex-conselheiro económico de Bill Clinton, ex-vice-presidente do Banco Mundial e Prémio Nobel de Economia), em situações de monopólio estes são extremamente eficientes a explorar essa posição de vantagem em detrimento dos consumidores. Como é do conhecimento geral esta era, e é, a situação da GALP na medida em que embora partilhando o mercado de retalho com outros operadores é o único refinador e o maior armazenador e distribuidor nacional, pelo que os restantes operadores se limitam a seguir paulatinamente os preços que aquela fixa.

Associada à liberalização devia estar uma adequada monitorização e disponibilização de informação à Administração Pública, de forma a garantir uma concorrência efectiva, assumindo neste quadro um papel de relevo a Autoridade da Concorrência[4], mas o que tem ressaltado da actuação desta é uma mera validação do comportamento (leia-se fixação de preços) da GALP, tanto mais que nem o governo dispõe de qualquer mecanismo que lhe permita influenciar o preço cobrado à saída dos postos de abastecimento dos combustíveis, nem lhe interessa uma tal hipótese, na medida em que a receita fiscal é parte significativa daquele preço.

Pedir explicações sobre o preço dos combustíveis a um membro do governo, como pretende Paulo Portas[5], é ridículo e em simultâneo constitui uma manobra para escamotear a realidade aos olhos dos consumidores, uma vez que nem este governo, nem outro qualquer, dispõe de mecanismos de intervenção depois de que, em 1999, o governo de António Guterres, privilegiando o primado da soberania do mercado e da livre concorrência, decidiu avançar com a privatização do único operador nacional no sector dos combustíveis – a GALP[6] –, concretizando a opção assumida 9 anos antes pelo governo de Cavaco Silva e vendendo mais de um 1/3 do capital da gasolineira nacional ao consórcio PETROCONTROL, liderado pela gasolineira francesa TOTAL; na prática, Cavaco Silva[7] e Guterres, mais não fizeram que aplicar à letra as regras ditadas anos antes pelos especialistas do FMI que monitoraram (e financiaram) a economia portuguesa durante as décadas de 70 e 80.

Perante estes factos duas observações podem (e devem) ser feitas: a primeira sobre as virtualidades do modelo de liberalização preconizado pelo FMI; a segunda sobre a adequabilidade (e o controlo) do algoritmo de calculo utilizado.

A liberalização dos mercados a todo o custo tem sido a imagem de marca dos ortodoxos defensores do primado da “mão invisível” como entidade esotérica de resolução de todos os problemas. Uma espécie de entidade mística que tudo resolverá e que assim isenta de responsabilidades os seus fieis seguidores. No caso português (como em tantos outros por esse mundo fora onde o FMI impôs a sua lei) a aplicação cega duma política de desestatização de sectores chave da economia sem o prévio cuidado de regulamentação e de criação de efectivas condições de concorrência resultou em situações de formação de monopólios privados actuando à margem de toda e qualquer lei.

A prova real da ineficiência dos escassos mecanismos de controlo dos preços, a nível nacional, é tanto mais verificável quanto no último trimestre se constatou uma redução superior a 30% na cotação do “crude” que em termos de preço final dos combustíveis em Portugal se traduziu numa descida de 8% no gasóleo e 4% nas gasolinas (16% e 8% antes de impostos) e, segundo refere Pedro Santos Guerreiro numa crónica no JORNAL DE NEGÓCIOS, o próprio comissário Europeu da Energia, Andris Piebalgs, diz que a Autoridade da Concorrência «…"tem de acompanhar melhor o mercado dos combustíveis", para "confirmar permanentemente que não há práticas de cartelização entre as gasolineiras"».
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[1] Mais directamente ligados com esta questão podem consultar os “posts”: «ATENÇÃO AO QUE SE LÊ NOS JORNAIS», «BOICOTES» e «AINDA O PREÇO DOS COMBUSTÍVEIS»
[2] A propósito da actuação da Autoridade da Concorrência, veja-se o que a TSF noticiou, sob o título «Especialista critica acção fiscalizadora de Autoridade da Concorrência», que se pode resumir nas próprias palavras do especialista António Costa e Silva: «Alguma coisa está errada aqui ou em termos do algoritmo ou em termos da fiscalização que a Autoridade da Concorrência claramente não faz».
[3] Portaria nº 1423-F/2003
[4] Pode confirmar aqui o teor da sua missão.
[5] Notícias de última hora (lida aqui no DIÁRIO DIGITAL) dão conta de idêntica intenção manifestada pelo PSD.
[6] A Galp Energia, SGPS, S.A. foi constituída em 22 de Abril de 1999, sob a denominação GALP – Petróleos e Gás de Portugal, SGPS, S.A., em resultado da reestruturação do sector energético em Portugal, para operar no sector petrolífero e do gás natural. A Galp Energia agrupou a Petrogal, a única empresa refinadora e principal distribuidora de produtos petrolíferos em Portugal e a GDP, sociedade responsável pela importação, transporte e distribuição de gás natural em Portugal. Actualmente, a Galp Energia é o principal Grupo integrado de produtos petrolíferos e gás natural do país, com uma presença crescente em Espanha e uma actividade em desenvolvimento no sector da produção e de fornecimento de energia eléctrica. (in http://investor.relations.galpenergia.com/galpir/vPT/Galp_Energia/Fact_Sheet/).
A Petrogal – Petróleos de Portugal, foi constituída em 1976, integrando o projecto de nacionalizações e resultou da fusão de quatro empresas petrolíferas – SACOR, Petrosul, Sonap e Cidla. Até ao início da década de 90 foi uma empresa de capitais exclusivamente estatais. Em 1990, o governo anuncia a sua decisão de privatizar determinadas empresas, nas quais a Petrogal estaria incluída. Em finais de 1990 e princípios de 1991 forma-se um consórcio nacional, a Finepetro, que incluía o Grupo Espírito Santo, o Grupo Champalimaud, o Grupo José de Mello, Manuel Bulhosa, o Grupo Roquete, Parfil e a Fundação Oriente. A Finepetro associada a um parceiro estrangeiro, a Total cria a Petrocontrol S.G.P.S, ficando com 51% das acções deste grupo. O Decreto Lei 353/91 de 20/09/1990 definia o quadro geral da privatização da Petrogal. O único concorrente que se apresentou a concurso foi a PetroControl, ficando a estrutura accionista da Petrogal, repartida na primeira fase do concurso, em 25% para o grupo Petrocontrol e os restantes 75% para o Estado. Nesta primeira fase, a Petrogal viveu momentos um pouco difíceis, após o conhecimento em finais de 1992 que o Estado teria tomado a decisão de realizar a Expo 98, obrigando ao desmantelamento de todas as instalações de Cabo Ruivo. A Petrocontrol sofre algumas alterações no seu capital accionista, com o Grupo Roquete a vender a sua participação ao Tota, e com o abandono de Manuel Bulhosa e da Total, que vende os seus 49% de participação na Petrocontrol ao Governo Português. Numa segunda fase de privatização, em 1995, a Petrocontrol aumenta o seu capital accionista para 45%, quedando-se o Estado com 55%. Até 1999, ano da sua integração na Galp Energia, a Petrogal finaliza a operacionalidade do pipeline de Sines e a dessulfuração do gasóleo, aumenta a sua penetração na África Lusófona e adquire em cerca de 20% o Capital da Trangás. (in http://www.historia-energia.com/Por2/glossario_detalhe.asp?idGlossario=191)
[7] Segundo a TSF on line, também o actual Presidente da República se referiu hoje à candente questão, considerando-a «complexa» e dizendo que «não se pode responder de forma muito apressada», para mais num contexto de «crise financeira internacional muito forte». Por outras palavras, pouco mais que banalidades e pior, para um economista de renome, misturando problemas como a formação de preços no mercado doméstico com uma crise financeira internacional originada num processo de desbragada especulação.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

MAIS UM SINAL DOS TEMPOS?

Forçado a demitir-se por fundadas acusações de corrupção[1], ficaremos a conhecer amanhã o sucessor de Ehud Olmert na liderança do Kadima e seu possível sucessor à frente do governo de Israel.

Os dois candidatos são Shaul Mofaz (Ministro dos Transportes) e Tzipi Livni (Ministra dos Negócios Estrangeiros), ambos ministros no gabinete que Olmert tem chefiado, mas segundo o YEDIOT AHARONOT as semelhanças entre os dois candidatos terminam aqui e se Tzipi se apresenta como uma incógnita, face ao pragmático Mofaz, a vitória do seu adversário é vista por muita gente como um terramoto para o Kadima, cujas réplicas poderão mesmo originar uma divisão no partido.

Enquanto o actual Ministro dos Transportes e antigo Ministro da Defesa pode invocar o seu treino e passado militares, Tzipi Livni apenas poderá recordar a sua passagem pela… Mossad[2]! É verdade, a favorita nas sondagens foi agente da polícia secreta israelita[3].

Se a conjuntura não se alterar significativamente, depois de um Putin que chegou à política após uma passagem pelo KGB[4], poderemos vir a ter uma primeira-ministra israelita que também foi agente-secreta.

Dito assim, pode parecer que a anterior actividade de Tzipi Livni constituirá, em meu entender, algum óbice à sua possível escolha para a liderança do Kadima ou do governo de Israel, porém, o que deveria ser efectivamente preocupante era o conhecimento (pela positiva ou pela negativa) de qualquer envolvimento dos candidatos em “actividades” idênticas às que provocaram a “queda” de Ehud Olmert.

Quanto à importante questão palestiniana, não creio que qualquer deles possa vir a constituir uma efectiva contribuição para a única solução que me parece viável e com sustentabilidade para perdurar no futuro – a da integração das populações palestinianas e israelitas, em situação de efectiva igualdade de deveres e direitos, num estado onde as duas nações possam cooperar e prosperar – algo que se os homens continuarem a revelar-se intransigentes, talvez circunstâncias como a profunda crise que abala o sistema financeiro mundial (um dos mais importante bastiões mundiais do “lobby” judaico) possa vir a alterar.
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[1] As cada vez mais frequentes alusões tornaram-se uma irrefutável realidade após a confissão em tribunal que o milionário judeu americano Morris (Moche) Talansky fez dos pagamentos ilegais efectuados a Olmert ao logo de mais de uma década, como noticiou o HAARETZ.
[2] A Mossad é a agência de informação (espionagem ou inteligência) israelita, orientada para a realização de operações fora das suas fronteiras; a congénere cujo teatro de operações se confina ao interior do território israelita é o Shin Bet.
[3] Desenvolvimentos sobre esta informação podem ser lidos nesta notícia do TIMES on line.
[4] KGB era a designação da agência de informação russa na época da União Soviética; equivalente à congénere norte-americana CIA, acumulava às actividade externa a vertente de segurança interna, que no modelo americano é desempenhado pelo FBI.

domingo, 14 de setembro de 2008

TOO BIG TO FAIL…

A semana iniciou-se com a notícia da intervenção do Tesouro norte-americano nas duas principais instituições financiadoras do crédito hipotecário naquele país. Conhecidas sob a designação de Fannie Mae e Freddie Mac, tratam-se de empresas privadas que operam, sob mandato público, como financiadores de bancos e outras empresas financeiras que concedem créditos hipotecários; classificadas entre as “too big to fail[1] vêem agora abertas os cofres públicos para as salvar, e aos seus accionistas, da falência.

Desde as primeiras notícias sobre a crise do “subprime” que o Fannie Mae e o Freddie Mac passaram a estar no centro das atenções de banqueiros (clientes das duas empresas), do FED (entidade de financiamento e supervisão do sistema financeiro norte-americano) e dos milhões de agregados familiares que com maiores ou menores dificuldades se lançaram na aquisição de habitações próprias. Aos primeiros sinais de dificuldades registadas pelos bancos que realizaram investimentos desproporcionados em produtos derivados daqueles créditos hipotecários (créditos que para cúmulo foram contratados com agregados familiares de baixos rendimentos ou de rendimentos incertos – o tal “subprime”) que normalmente beneficiaram de classificações de risco em função da credibilidade do banco emitente e não da solidez dos créditos hipotecários subjacentes, a solução gizada pelas autoridades financeiras (FED, nos EUA, BCE, na UE, e bancos centrais noutros países) foi a de disponibilizar volumes crescentes de fundos (dólares, euros e outras divisas) aos bancos por forma a evitar uma degradação dos seus balanços, a quebra de confiança dos depositantes e, no extremo, a falência.

Quase volvido um ano, após sucessivas injecções de moeda e a persistência dos sintomas de degradação da situação, a administração Bush resolveu dar mais um passo no sentido de evitar o colapso e em meados de Julho, o secretário do Tesouro norte-americano, Henry Paulson, pediu autorização ao Congresso para poder comprar participações ilimitadas naquelas duas empresas bem como conceder-lhes financiamentos. Na oportunidade aquele responsável governativo afirmou (segundo esta notícia do JORNAL DE NEGÓCIOS) pretender evitar o colapso da confiança no sector financeiro e não excluiu mesmo a utilização, em caso de necessidade, de dinheiro dos contribuintes.

Prometido e cumprido! No passado dia 7 a administração Bush anunciou uma nacionalização envergonhada do Fannie Mae e do Freddie Mac e de pronto tudo pareceu resolvido.

Como num passe de mágica ou algo saído da prolixa imaginação dos guionistas cinematográficos de Hollywood, eis que os mercados de capitais registaram, na segunda-feira seguinte, rápidas e fulgurantes subidas, como noticiou o FINANTIAL TIMES, enquanto o nosso DIÁRIO ECONÓMICO anunciava que o «...sistema financeiro dos Estados Unidos voltou a fazer história. Com o objectivo de evitar o colapso das duas maiores instituições hipotecárias do país (Fannie Mae e Freddie Mac), o governo norte-americano decidiu tomar o controlo destas empresas, substituindo os seus presidentes e eliminando dividendos», só que isso custará ao Tesouro norte-americano (e aos seus contribuintes) um valor ainda por apurar, mas que, segundo a mesma fonte, poderá atingir os 211 mil milhões de euros (1,3 vezes o PIB português)... e esta foi apenas a terceira intervenção, depois das ajudas ao Bear Stearns e ao IndyMac, do governo americano no sistema financeiro após o início da crise do “subprime”, mas, a avaliar pelas notícias do FINANTIAL TIMES e do LE MONDE que dão conta da desesperada situação financeira do LEHMAN BROTHERS, não deverá ser a última, pelo que não tardará a surgir a questão: até onde o super endividado orçamento federal norte-americano poderá suportar este esforço? e até onde os contribuintes estarão dispostos a aceitar que “pagar” pelos erros de gestão dos sumptuosamente remunerados administradores das empresas financeiras?

Mesmo admitindo a legitimidade e a boa intenção que rodeará a decisão de evitar a todo o custo as falências do Fannie Mae e do Freddie Mac – com as inevitáveis consequências sobre a economia em geral e em particular sobre o já debilitado mercado imobiliário – esta torna-se particularmente difícil de entender no contexto de uma economia que se vangloria dos extremos benefícios das suas práticas liberais (e que até se autoproclama seu principal defensor e divulgador mundial) e pior, é passível de duras e fundadas críticas dos investidores noutros sectores de actividade que dificilmente entenderão a dualidade de critérios que justifiquem a apoio apenas a empresas do sector financeiro.

Enquanto a opinião pública ainda digere a notícia e a enormidade do esforço financeiro que a opção vai exigir, o coro de críticas ainda não se faz sentir, mas outros factores poderão contribuir para acelerar todo este processo. Entre estes destaco o anúncio de que os dois CEO[2] do Fannie Mae e do Freddie Mac deverão receber milhões de dólares a título de indemnização[3] pelo seu afastamento dos cargos, algo tanto mais inexplicável quanto alguns fontes atribuem responsáveis um importante papel no colapso das instituições que dirigiram.

A confirmar-se esta situação e o esperado colapso (e a consequente venda) do Lehman Brothers, qual irá ser agora a reacção do mercado?

E as soluções até agora aplicadas pelo FED (cortes sucessivos nas taxas e injecções constantes de enormes volumes de crédito) e pelo Tesouro norte-americano (intervenção administrativa no Fannie Mãe e no Freddie Mac) em que medida irão ajudar as famílias sobreendividadas?

Ou tudo não passará afinal de uma enorme farsa para manter a predominância dos banqueiros na definição das orientações económicas globais?

Estarão os responsáveis da administração americana (actuais e futuros), os dos bancos centrais (FED, BCE e outros) e os dos organismos internacionais (FMI, Banco Mundial e OMC) disponíveis para prestar atenção a avisos como o que proferiu há cerca de um mês um ex-economista chefe do FMI, Kenneth Rogoff, quando afirmou[4] que a crise irá continuar a aprofundar-se e que iremos assistir ao colapso não apenas de bancos de média dimensão mas também ao de algum dos grandes? e abertos a críticas como a que o mesmo especialista proferiu contra a política de descida abrupta de taxas seguida pelo FED?
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[1] Expressão utilizada na terminologia económica anglo-saxónica para designar as empresas que pela sua enorme dimensão e importância no mercado não poderão falir.
[2] Chief Executive Officer, termo anglo-saxónico que designa o cargo de maior responsabilidade ou autoridade numa organização. Entre nós a designação pode ser aplicada às funções de Administrador-Delegado ou Presidente da Comissão Executiva.
[3] Ver a notícia do WASHINGTON POST, «Ousted Fannie, Freddie CEOs Could Still See Big Paydays», que refere como possíveis montantes de indemnização valores da ordem das duas dezenas de milhões de dólares.
[4] A referência foi extraída da notícia «US bank ‘to fail within months’» difundida pela BBC NEWS.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

SETE ANOS APÓS O 11 DE SETEMBRO DE 2001

Quando se cumpre o sétimo ano sobre a destruição do World Trade Center e poucos dias decorreram após George W Bush ter voltado a renovar por mais um ano a declaração de situação de emergência proclamada, ao abrigo do National Emergencies Act[1], no dia 14 de Setembro de 2001, que balanço pode ser feito daquele trágico acontecimento?

Além das cerca de 4.000 vítimas que produziu de imediato[2] e da polémica que ainda hoje subsiste em torno do que efectivamente ocorreu naquele dia[3], outras consequências podem ser associadas ao evento, das quais destaco:

  • as invasões do Afeganistão, a pretexto da intenção de captura do declarado responsável pelo atentado – Bin Laden – e da organização – Al Qaeda – que dizem liderar, e do Iraque, sob o duplamente falso argumento do apoio de Saddam Hussein à Al Qaeda e a Bin Laden e de um pretenso arsenal de armas de destruição em massa que nunca foi encontrado;
  • a instauração de um regime quase policial nos EUA, em resultado da aplicação de uma Lei de Emergência Nacional que amplia desmesuradamente os poderes presidenciais face ao controlo do Congresso e limita profundamente as liberdades e garantias individuais dos cidadãos daquele país, vedando-lhes as mais elementares condições de defesa, decisão que seguramente contribuiu para a criação de prisões especiais para os acusados de terrorismo, nomeadamente em Guantánamo;
  • a instalação, um pouco por todos os países ocidentais, de um clima de terror que, à excepção dos atentados de inspiração islâmica radical que ocorreram em Espanha, Reino Unido, raramente conheceu razões fundamentadas[4]; os outros vários atentados atribuídos à Al Qaeda ou a organizações radicais islâmicas tiveram lugar em países islâmicos (Marrocos, Tunísia, Egipto, Turquia, Arábia Saudita, Paquistão e Indonésia) ou antecederam o 11 de Setembro de 2001 e visaram interesses norte-americanos (Yemen, Quénia, Tanzânia);

que poderiam ter sido evitadas caso não imperasse em Washington um sentimento de sobranceria e de profundo desrespeito pelas regras e convenções de relacionamento entre estados. Não fora a dominância das teses neoconservadoras, principalmente as que sustentam o unilateralismo norte-americano, e talvez a insanidade que constituiu a destruição das Torres Gémeas não tivesse crescido em espiral e o mundo não conhecesse hoje uma situação pior que a que então registava.

A administração de George W Bush e o grupo dos “neocons” que a inspira geriram a crise do 11 de Setembro em manifesto benefício dos seus interesses específicos – o controlo das regiões produtoras de petróleo – e dos seus apoiantes – o aumento das despesas com o aparelho industrial-militar norte-americano – manipulando a informação por forma a impedir um real e efectivo esclarecimento dos acontecimentos. Foram rápidos a apontar o responsável mas, estranhamente (ou talvez não…), o mais poderoso e bem armado exército do planeta não conseguiu, nos quase sete anos que leva a ocupação do Afeganistão, encontrar Bin Laden. Foram rápidos a capitalizar o natural sentimento de revolta popular (americana e não só) mas igualmente expeditos a ignorar a avaliação da situação que os seus parceiros naturais (principalmente os países europeus) recomendavam e a mergulhar o mundo numa espiral de violência que não pode senão servir os interesses dos extremistas que dizem querer combater.

Enquanto se revelam cada vez mais difíceis de escamotear os desastrosos resultados da decisão de intervir militarmente no Médio Oriente[5] e não param de se avolumar as dúvidas sobre a real influência que o “lobby” judaico (quer por via directa quer pelas conhecidas ligações entre as principais figuras do movimento “neocon” e organizações judaicas) e as conhecidas ligações da família Bush e de Dick Cheney às grandes companhias petrolíferas terão tido nesta decisão, continuamos a assistir ao desenrolar de uma política de “afiar garras” de que os recentes desenvolvimentos no Cáucaso serão mais uma etapa...

...quem poderá espantar-se, sinceramente, do crescimento das chamadas teorias da conspiração?[6]
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[1] Lei de Emergência Nacional que estabelece poderes especiais ao presidente da federação pelo período de dois anos.
[2] Embora haja quem tente manter um registo actualizado (uma das principais entidades que o faz é a IRAQ BODY COUNT) das baixas militares e civis que têm ocorrido nos cenários de guerra que os EUA inflamaram, o seu número é objecto de alguma controvérsia, mas parece-me aceitável falar, entre civis e militares) em números próximos da centena de milhares.
[3] Sobre esta questão existe abundante informação disponível na Internet (qualquer motor de busca produzirá milhares de entradas relacionadas com as Torres Gémeas e o 11 de Setembro) incluindo alguns “posts” que produzi sobre o assunto: «11 DE SETEMBRO DE 2001», no ano passado e «NINE ELEVEN – PARTE I», «NINE ELEVEN – PARTE II», «NINE ELEVEN – PARTE III» e «COM ISSO NÃO SE BRINCA», em 2006.
[4] À parte os atentados nas redes de transportes em Espanha e no Reino Unido, dos quais resultaram um elevado número de mortos e feridos, muitas outras notícias surgiram a propósito de planos para o envenenamento de depósitos de água, de deflagração de pequenos engenhos nucleares e de disseminação de virús e outros químicos (antrax), quase todas acabando por se revelarem infundadas ou simplesmente alarmistas.
[5] Sobre os elevados custos da intervenção militar norte-americana, ver este artigo da BBC e quanto aos resultados práticos na eliminação da Al Qaeda, ver este outro do COURRIER INTERNATIONAL.
[6] Ainda há cerca de dois meses a BBC divulgava um artigo «The evolution of a conspiracy theory» que sintetiza muito bem as diferentes abordagens sobre esta questão.

domingo, 7 de setembro de 2008

À DIREITA NADA DE NOVO

Pronto, está feito!

A líder do PSD falou finalmente.
No encerramento da 6ª edição da Universidade de Verão do PSD, Manuela Ferreira Leite mimoseou o país com um discurso que o EXPRESSO não hesitou em designar de libertador[1] e de que o PUBLICO, de pronto, ressaltou o lado crítico[2].

Mas, lido o texto do discurso[3] sou levado a conclusões diferentes; à direita nada de novo!

Não que Manuela Ferreira Leite não tenha retomado o tema que o seu vice-presidente, António Borges, já glosara na sua intervenção no início da semana[4] e aproveitado a oportunidade para repetir o discurso de branqueamento das responsabilidades do PSD (a par com as do PS) no descalabro que têm sido as políticas económicas aplicadas desde os tempos de Cavaco Silva e ainda menos tenha enjeitado a oportunidade para tecer loas às milagrosas políticas que teriam sido aplicadas sob a direcção do seu partido – mesmo sem uma única vez as concretizar ou sequer ter apresentado uma crítica directa e substantiva às políticas aplicadas por José Sócrates.

Nos tempos que correm, ainda sob a forte influência da “vaga criminosa”, fica sempre bem a qualquer político da oposição criticar o sentimento de falta de segurança, embora seja difícil perceber das palavras que proferiu Manuela Ferreira Leite o que teria sido diferente sob a sua direcção. Será que a simples presença do PSD no governo teria bastado para suster a vaga de crimes ou a vaga noticiosa que transformou quase todos os meios de comunicação nacional em “jornais do crime”, pura e simplesmente não teria ocorrido?

A acusação lançada por Manuela Ferreira Leite de que a reforma da Administração Pública serviu fundamentalmente para a adequar aos interesses do PS pode ser muito real e verdadeira, mas novamente se recoloca a questão de saber qual foi a actuação do PSD durante a vigência dos seus governos. Poderá a líder do PSD nunca se ter apercebido da “dança de cadeiras” que regulamente regista a Administração Pública ao sabor dos ventos das mudanças políticas?

Relendo a notícia do EXPRESSO começa-se a tornar clara a explicação para o título escolhido, Manuela Ferreira Leite propõe-se “libertar o país” da actuação do PS... para o entregar ao PSD. A intenção poderá ser muito bem acolhida entre os “apparatchiks[5] laranjas e explicar-se-á ainda melhor porquanto o discurso proferido foi precisamente para uma assembleia de candidatos a “apparatchiks”; para os outros portugueses, os que se terão dado ao trabalho de lerem as notícias, a versão integral do discurso, ou até este “post” o que ficou?, apenas a tristeza de vir a assistir a mais do mesmo (com o PS ou com o PSD) na próxima legislatura!
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[1] Ler o artigo sob o título: «Ferreira Leite propõe-se a "libertar o país"».
[2] Este intitula-se «Ferreira Leite critica políticas económica e de segurança».
[3] O texto integral encontra-se disponível nesta página do POVO LIVRE.
[4] Conteúdo que apreciei e critiquei aqui.
[5] Termo russo usado para designa os membros do aparelho (apparat) político da antiga URSS; actualmente usa-se para designar os que provocam estrangulamentos burocráticos e originam a ineficiência das organizações ou, aqueles que são designados em função da sua filiação partidária para o desempenho de cargos para os quais estão pouco ou nada habilitados.